Qualquer progresso no encontro entre presidente da Guiana, Irfaan Ali, e o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, para discutir a questão do Essequibo, dependerá do processo de mediação dos países vizinhos.
Isso porque Ali e Maduro partem de posições inarredáveis. Por exemplo, a Guiana assegura que Essequibo é seu território, segundo acordos internacionais. Por sua vez, a Venezuela desconsiderou esses acordos e determinou a anexação da região ao seu domínio.
A região, formada em sua maior parte por florestas e áreas alagadiças, é rica em minérios, madeiras e petróleo – esse último explorado pela petrolífera norte-americana Esso Exploration & Production Guyana Limited.
Nesta quinta-feira (14/12), os dois líderes se encontram em St, Vicent & e the Grenatines, no Caribe, sob a observação dos países da comunidade caribenha, por um representante da Organização das Nações Unidas (ONU) e pelo Brasil.
O Brasil anunciou que terá uma representante, o assessor internacional do presidente Lula, o ex-chanceler Celso Amorim.
A recomendação do presidente Lula é a de que os dois países evitem a deflagração de um conflito bélico na região.
Fronteira do Brasil
Analistas militares afirmam que, para atingir a Guiana, as forças venezuelanas têm como caminho mais fácil atravessar a fronteira com o Brasil. O país também faz fronteira com a Guiana.
As forças armadas brasileiras anunciaram que podem mobilizar até 20 mil soldados, mais equipamentos de guerra, para proteger o seu território.
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Tema fora da mesa
Jornais da Guiana veiculam que o presidente Ali enviou carta ao primeiro-ministro de São Vicente, Ralph Consalves. No texto, ele reitera que a controvérsia fronteiriça [com a Venezuela] não faz parte da mesa de discussão, uma vez que esse é um assunto ligado diretamente ao Tribunal Internacional de Justiça (TIJ).
A proposta do “alto diálogo”, sob mediação de observadores, foi articulação de Gonsalves. Em carta enviada ao anfitrião, Ali esclarece que no encontro que só tratará de “imprecisões” espalhadas por Maduro acerca do tema.
“Na minha carta anterior, indiquei o meu entendimento de que a reunião será conduzida em consonância com o quadro elaborado para tal reunião no Comunicado dos Chefes de Governo da Caricom de 8 de dezembro de 2023”, disse Ali.
Já Maduro, em carta enviada a Gonsalves em 11/12/2023, afirma: “[…] o ‘diálogo de alto nível’ para o qual você nos convidou, é “para abordar diretamente a disputa territorial entre a Venezuela e a Guiana […]”.
Apoio parlamentar a Ali
O presidente da Guiana reiterou que ele também tem a posição da Assembleia Nacional da Guiana. O parlamento é “unânime na sua decisão de que a fronteira terrestre não é um problema para discussões bilaterais, porque a resolução da questão cabe adequadamente no Tribunal Internacional de Justiça, onde deverá permanecer até que o tribunal dê sua decisão final sobre o mérito do caso”.
Ele assegura que a Guiana sempre esteve disposta a aceitar a decisão final da justiça internacional.
Ao mesmo tempo, Ali disse que vai à reunião em atenção à recomendação da comunidade caribenha. Esta apela a “uma desescalada do conflito por meio de um diálogo apropriado entre os líderes da Venezuela e da Guiana”.
Ou seja: “Para assegurar a coexistência pacífica, a aplicação e o respeito do direito internacional e evitar o uso ou ameaças de força.”
Independência
O presidente pauta seus argumentos no Acordo de Genebra. Este data de 17 de fevereiro de 1966, entre o Reino Unido/Guiana Britânica e a Venezuela, pelo qual a ex-colônia britânica tornou-se independente.
O acordo, por sua vez, forneceu vários mecanismos para a Guiana e à Venezuela resolverem a contenção venezuelana de nulidade e invalidez da sentença por negociações.
Caso contrário, caberá às Nações Unidas escolherem um meio final de resolução da controvérsia. “Esse é o processo que foi escrupulosamente seguido [pela Guiana]”, afirmou Ali.
Principais argumentos de Ifaan Ali:
A Venezuela nunca apresentou qualquer apoio credível ou prova para a sua opinião sobre a nulidade e invalidade da Sentença Arbitral de 1899, que estabeleceu a fronteira entre a então Guiana Britânica e a Venezuela
O país [a Venezuela] não produziu provas que contradizem a validade do Acordo de 1905, assinado por ambas as partes, fixando a fronteira ao longo da linha estabelecida na Sentença Arbitral de 1899
Entre 1899 e 1962, a Venezuela aceitou e reconheceu essa fronteira como a fronteira internacional.
Esse reconhecimento entre os dois Estados é refletido em todos os mapas oficiais da Venezuela publicados durante esse período de mais de 60 anos.
O Acordo de Genebra de 1966 fornece garantias de uma solução final ao conferir ao Secretário-Geral das Nações Unidas a autoridade para escolher o Tribunal Internacional de Justiça como meio de resolver a controvérsia de acordo com o direito internacional
Maduro é impreciso quando se refere a concessões petrolíferas “numa área marítima ainda por delimitar”.
Contrariamente a essa afirmação enganosa, todos os blocos petrolíferos estão localizados bem dentro das águas da Guiana, ao abrigo do direito internacional, incluindo a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que garante aos Estados costeiros os direitos exclusivos sobre os recursos do mar e fundo marinho num raio de 200 milhas náuticas das suas costas. Os blocos petrolíferos estão todos localizados adjacentes à costa da Guiana e num raio de 200 milhas náuticas dela.
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Retórica de Maduro
Logo após o plebiscito que decidiu pela anexação Essequibo ao território Venezuela, em 3/12, Maduro determinou medidas administrativas e militares para a região.
Além disso, ele apresentou um novo mapa com o território guianense anexado, e referiu-se a configuração geográfica anterior aos desejos dos imperialistas colonizadores.
A decisão de Maduro causou preocupação entre os países vizinhos. Isso porque a região em questão possui campos de petróleo descobertos recentemente, além dos que já explorados pela Esso há mais tempo.
Dessa maneira, o boom do petróleo no Essequibo elevou o Produto Interno Bruto da Guiana para 62, 93%, em 2022. Foi o maior do mundo, somando US$ 15,33 bilhões, segundo Fundo Monetário Internacional (FMI).
Foto: divulgação / IICA / José Cruz / Agência Brasil / Montagem: BNews