O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, rejeitou a proposta do Governo do Amazonas de conciliação de tombamento do Encontro das Águas e a construção do porto das Lajes, previsto para ser instalado no local.
Em despacho nesta quarta-feira (3), Aras considerou alguns entraves à celebração do acordo proposto pelo governo e ainda prorrogou a tramitação das três ações judiciais que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) por mais 120 dias.
O prazo anterior, de 120 dias, concedido pela relatora das ações de conciliação, ministra Cármen Lúcia, terminou no último dia 1° de novembro.
Esse embate judicial, trata-se de procedimento administrativo que acompanha os processos de conciliação, no âmbito das ações (ACO) do Amazonas que tramitam no STF (2.512, 2.513 E 2.514).
As ACO dizem respeito ao tombamento do Encontro das Águas, bem como homologação do ato, contrariando decisão do Governo do Amazonas que em juízo apresentou proposta conciliadora em favor da construção do porto das Lajes.
Histórico das ações
O imbróglio judicial teve início em 2010 e, no ano de 2015, o Amazonas apresentou pedido de designação de audiência de conciliação.
Em 2018, a Lajes Logística S.A. – entidade empresarial que pretende instalar o empreendimento portuário na área de entorno do Encontro das Águas – apresentou manifestação por meio da qual solicitou a perda do objeto das três ações originárias, ante o tombamento provisório do bem e o estabelecimento de diretrizes, pelo Iphan, para intervenção na área tombada e seu entorno.
Posteriormente, o estado tornou a solicitar a suspensão dos processos para tentativa de conciliação. A PGR solicitou vista conjunta dos autos para se manifestar acerca da petição da Lajes e para analisar a viabilidade de conciliação. A PGR também solicitou documentos, audiências públicas, manifestações dos órgãos ambientais, como ICMbio, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e um posicionamento do Ministério Público do Amazonas (MP-AM).
Proposta do Amazonas
O Governo do Amazonas, por meio da Procuradoria-Geral do Estado (PGE-AM), apresentou uma proposta de conciliação onde declara que não tem mais discordância e nem resistência ao processo de tombamento do Encontro das Águas.
Contudo, a PGR afirma que dentro desse acordo há pedidos que permaneceriam controvertidos ou sobre os quais haveria disposição implícita e total, em razão de a proposta do governo no estado não mencionar expressamente a liberação do empreendimento portuário, o porto das Lajes.
O governo estadual propõe que a União seja desobrigada de fazer a concessão ou, na hipótese de já praticado o ato administrativo, a anulação da inscrição de ocupação de terreno marginal dos rios Negro e Solimões.
Solicita ainda que o Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas (Ipaam) seja o responsável pela suspensão/anulação do licenciamento ambiental do terminal portuário das Lajes.
O Ipaam também poderá impedir ou acolher a concessão de licenças ambientais pelo órgão no perímetro de proteção do bem natural e seu entorno, sem precisar ouvir previamente o Iphan e o ICMbio.
Assim como a Antaq seria impedida de autorizar a construção e a exploração de terminais portuários na região objeto de proteção judicial.
A contrariedade de Aras
O procurador-geral da República rejeitou justamente essas imposições e desobrigações constantes do acordo proposto pelo Amazonas.
No parecer, Aras afirma que a natureza da proposta amazonense não estabelece “efeitos concretos imediatos, tampouco cronograma minucioso para a implementação das sucessivas etapas do projeto”.
Ainda mais, traz em seu bojo “potencial violação ao princípio da precaução, uma vez que a proposta de acordo prevê o início de estudos apenas após homologada a conciliação e não delibera sobre a instalação do empreendimento pretendido pelo grupo econômico”.
O despacho do procurador-geral registra também “ausência de previsão sobre a participação de outros atores, demandados ou não nas ações como sucede com órgãos de fiscalização ambiental/cultural, cuja integração ao projeto pode vir a ser necessária”.
De qualquer forma, Aras encerra chamando atenção da “indefinição sobre possíveis condições resolutivas do acordo ou sobre fatos geradores da descontinuidade do projeto, tais quais eventual sucessão governamental do estado, impedimentos opostos por atores estatais externos ao acordo, redimensionamento do perímetro inicialmente sugerido para o CCB (Complexo Biocultural), entre outros”.
SOS Encontro das Águas
Para o coordenador do Movimento SOS Encontro das Águas, professor Ademir Ramos, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), a manifestação do procurador-geral da República fortalece a luta em defesa do patrimônio natural, cultural, etnográfico, arqueológico, palenteológico que é o Encontro das Águas.
“Por outro lado, a gente luta no sentido de fazer com que o entorno dessa região, seja Manaus, Iranduba, Cacau Pirera, Careiro da Várzea e toda a margem direita desse grande rio, participem do processo para exercer o controle e respeito a esse bem como sujeito de direito. O Encontro das Águas é para nós uma dimensão mitológica, um bem comum representativo no imaginário da cultura identitária do Amazonas”, disse o professor.
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