Governo vai insistir na ideia de fundir municípios de baixa arrecadação
Professor critica pacote de PEC do governo que pode extinguir municípios

Publicado em: 19/01/2020 às 10:18 | Atualizado em: 19/01/2020 às 10:18
A intenção do governo federal de extinguir municípios pequenos, de baixa arrecadação fiscal, logo, sem autonomia financeira, está bem viva no pacote de PEC (propostas de emendas à Constituição) para reformar o Estado.
Segundo o advogado Fernando Scaff, professor de direito financeiro da USP (Universidade de São Paulo), em entrevista à Folha, se aprovadas como estão, as PEC significarão redução de gastos sociais, aumento da desigualdade e insegurança jurídica.
“Acho que a extinção de municípios é um boi de piranha, porque é um absurdo. Acho que muitos municípios foram criados indevidamente, estou convencido disso. Mas foram criados de acordo com as normas em vigor. Você extinguir os municípios sem consulta à população é um absurdo”, disse o professor.
O pacote foi entregue ao Senado em novembro de 2019, e uma das regras propostas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, prevê a fusão de municípios nessa condição.
Nela, municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria menor que 10% da receita total será incorporado pelo município vizinho.
Segundo Scaff, a Constituição prevê a possibilidade de extinção de municípios, “mas desde que consultada a população. A PEC propõe que não haja a consulta”.
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Quadro na mira de Guedes
O Brasil tem 1.253 municípios com menos de 5 mil habitantes, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Isso equivale a 22,5% do total de 5.570 municípios brasileiros (incluindo o Distrito Federal). Juntos eles somam 4,21 milhões de habitantes, informou a Folha.
“Muitos municípios foram criados gerando novas despesas e não atendendo o cidadão na ponta. É o que queremos corrigir”, disse secretário especial do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues.
Na semana passada, a Firjan (federação das indústrias do Rio de Janeiro) divulgou estudo que mostra que uma em cada três cidades brasileiras não possui arrecadação própria suficiente para bancar sua estrutura administrativa (prefeitura e câmara de vereadores).
Isso representa 1.856 cidades de um total de 5.337.
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Crítica ao corte de subsídios
O professor da USP identifica outro erro nesse pacote de PEC, sobre a concessão de mecanismo para reduzir benefícios fiscais.
“Eu acho que tem que ter controle, nisso estamos de acordo, mas o mecanismo proposto é de muito difícil apuração. A PEC diz que, quando a somatória dos benefícios fiscais ultrapassar o percentual X globalmente considerado, o benefício desaparece. Em concreto, como isso vai se operar?”.
Scaff dá um exemplo:
Eu sou o concedente, a União, e dou para ti, para ele e para ele um benefício. Em algum momento, o negócio de vocês vai melhorar, e a renúncia fiscal vai aumentar. Aí ultrapassa [o teto de renúncia fixado na PEC] e corta de todos. Mas, corta como? Com que prazo, que velocidade? Qual a segurança jurídica disso?”.
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Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República