Ensaio antecipa novos apostas na arena. Embora sejam apenas uma prévia, os ensaios técnicos dos bois de Parintins se tornaram um espetáculo à parte. Com tudo a que tem direito, inclusive filas imensas e transmissão de TV e internet ao vivo.
São oportunidade para as galeras assistirem ao seu boi. Pois, nas apresentações, elas concorrem como item e trabalham arduamente, quase não assistindo ao espetáculo. Disputam ainda um troféu de Melhor Galera.
No dia 27 foi a vez do boi vermelho antecipar algumas de suas apostas. Pai Francisco e Mãe Catirina, por exemplo, finalmente têm o destaque que merecem.
Eles são os personagens negros do auto do boi. É pelo desejo de Catirina de comer a língua do boi preferido do amo que Pai Francisco mata o boi de sangue e faz viver o boi de pano. Eles são protagonistas no auto.
No entanto, sempre foram representados com um viés fortemente racista. Seus brincantes eram pintados ou vestidos com roupa para uma segunda pele de cor preta. Um recurso comumente utilizado para ridicularizar esse traço.
Algumas vezes, Mãe Catirina era ainda interpretada por um homem, um espaço que poderia ser ocupado por uma mulher.
Eram compreendidos como personagens cômicos. Ou seja, os negros do auto tinham a única função de fazer rir. Pois, embora sejam obrigatórios, não são item de competição. Não seria um problema ser cômico se não fossem os únicos a sê-lo.
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A carta aos bois
Em 2018, os jurados leram uma carta aos bois, na qual destacaram ainda que eles eram os únicos entre os personagens a também auxiliar na limpeza dos adereços caídos em cena, já que circulavam por toda a arena.
Então, desde 2019, os bois têm se esforçado ainda mais para alinhar suas práticas em cena a seus discursos de apoio na luta por igualdade.
Tal como sinaliza a mudança do ultrapassado e inadequado termo “tribos” para “povos”, para designar o componente indígena do espetáculo.
Ano a ano, foram caindo a Mãe Catirina representada por homens, o “black face”, a roupa segunda pele e o apelo cômico. Mas, ainda não tinham o justo protagonismo.
A julgar pelo ensaio técnico de ontem, o Garantido, finalmente, resolveu a questão em seu pavilhão. Pai Francisco e Mãe Catirina são interpretados por brincantes negros e participam de coreografias bem no centro da arena.
Foto: reprodução/internet