Manaus e Rio Branco (AC) são as capitais mais obesas do país, seguidas por Macapá (AP).
Os dados são da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso).
Mas, não é de hoje que a capital amazonense lidera o ranking. Desde que a obesidade começou a ser monitorada nas capitais, em 2013, Manaus figura no topo da lista.
Para fazer o mapa da obesidade no país, a Abeso contabilizou o Índice de massa corporal da população. Esse indicador é uma relação numérica obtida da altura e do peso corpóreo.
Desse modo, considera-se que indivíduos com massa corporal acima de 25 estão acima do peso ou com sobrepeso. E considera-se obesidade quando o índice é igual ou acima de 30.
A Abeso utiliza os dados da vigilância sanitária coletados em 2019. A pesquisa nacional de saúde é realizada a cada cinco anos.
Contudo, antes de acusar a farinha nossa de cada dia, vamos interpretar esses dados.
Primeiramente, é preciso destacar que Manaus não é a única a apresentar dados acima do que é esperado para uma população. Todas as 26 capitais estão com o percentual acima de 30% de prevalência de obesidade.
E são dez as que possuem prevalência acima de 40% na população adulta. O mapa não incluiu o Distrito Federal.
Dessa forma, o Brasil é um dos lugares com maior prevalência de obesidade no mundo.
Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, mais da metade dos adultos apresentavs excesso de peso (60,3%), o que representa 96 milhões de pessoas), com prevalência maior no público feminino (62,6%) do que no masculino (57,5%).
A pesquisa informa ainda que um em cada cinco adolescentes com idades entre 15 e 17 anos estava com excesso de peso (19,4%) e 6,7% estavam com obesidade.
Os dados da incidência na população infantil de até sete anos também aponta crescimento.
Uma questão de saúde pública
Todavia, o que importam esses números? A obesidade é considerada um fator de risco para condições crônicas, como hipertensão arterial, diabetes e cardiopatias, que já impactam o serviço público de saúde.
Por exemplo, a hipertensão arterial e diabetes são condições cujo descontrole pode passar despercebido até que ocorra uma complicação.
Tais complicações necessitam de intervenção hospitalar para serem contornadas.
Além disso, essas intervenções, em geral, necessitam de maior tempo de permanência na estrutura de urgência e emergência, ocupando leitos em hospitais e unidades de pronto-atendimento.
Há ainda outra questão para a saúde pública. Ao contrário de outros acometimentos, como acidentes e doenças cujos tratamentos terminam com a cura, as condições crônicas requerem medicação e acompanhamento durante toda a vida.
As complicações graves, como as renais, exigem ainda uma linha de atendimento cujo número de especialistas é insuficiente no serviço público. E mesmo no serviço particular.
As complicações renais, comuns em hipertensos e diabéticos, por exemplo, exigem profissionais especializados em nefrologia. Não apenas médicos, mas enfermeiros e técnicos aptos a operar equipamentos como os de hemodiálise.
Assim, a obesidade é um problema de saúde pública porque impacta o serviço público a longo prazo.
Isso porque os agravos surgem ao longo dos anos e o seu acompanhamento é para toda a vida.
Também impacta em efeito cascata, pois os agravos exigem desde a atenção primária até o que se chama de atenção de alta complexidade.
Por que Manaus?
Como se vê, a alta prevalência da obesidade não é uma questão isolada da capital do Amazonas. Vem crescendo no mundo inteiro. E o Brasil vem surgindo como um dos países mais obesos do mundo.
Tampouco é uma questão individual. Aliás, um indivíduo acima do peso é o menor dos problemas sociais quando se coloca em perspectiva a saúde coletiva.
Embora já seja possível sentir os efeitos psicológicos da estigmatização social dos corpos gordos.
Agravos como depressão e ansiedade relacionados à obesidade também começam a indicar um custo significativo para o serviço público.
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Uma questão social
Como resultado, a obesidade está relacionada a questões sociais amplas.
Uma das mais relevantes é o acesso a alimentos.
O Brasil é um país de notável desigualdade social. A parcela mais empobrecida da população é a maior.
Assim sendo, parte significativa das pessoas não pode escolher o que come, porém, come o que é possível comprar.
Nos últimos anos, o Brasil tem deixado de ser o país do arroz com feijão e tem se tornado o país do miojo.
No mesmo sentido, podemos dizer que Manaus pode estar deixando de ser a capital do peixe com farinha para se tornar a capital do macarrão instantâneo.
Note-se que, em um estudo de 2021, a Fundação Getúlio Vargas apontou que 67,07% da população do entorno metropolitano de Manaus estava pobre. Ou seja, cerca de 1,1 milhões de pessoas viviam com renda familiar per capita (por pessoa) inferior a 497 reais por mês.
No Amazonas, dizia-se para famílias com grande número de filhos que “a farinha cria”. Dado que a farinha amarela, marca fundamental da cultura alimentar do amazonense, é o principal acompanhamento para as carnes.
Sendo um farináceo, ela aumenta de volume quando hidratada, comumente, com os caldos de peixe.
Ou como se diz no Amazonas, a farinha “tufa”, dando logo a sensação de saciedade.
Porém, o preço da farinha amarela já não cria mais tantos filhos. O quilo do alimento custa, em média, entre 8 e 10 reais na feira da Manaus Moderna. Nos mercados da cidade, de R$ 10 a 12.
Dessa maneira, o caminho mais fácil acaba sendo o macarrão instantâneo, que custa, em média, 2,5 reais.
Há algumas décadas, a obesidade era interpretada como um sinal de fartura. No entanto, estudos recentes indicam que hoje é um sintoma da insegurança alimentar.
É a camada mais empobrecida da população que tem incrementado os números da obesidade no Brasil.
Assim, fica mais fácil de entender por que Manaus figura como a capital mais obesa do país.
Os dados de obesidade e pobreza, assim relacionados, indicam que quase 70% da população não tem podido comer melhor.
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Enxugando gelo
Com o objetivo de reduzir o impacto da obesidade sobre a saúde pública, a Prefeitura de Manaus tem executado políticas para tornar possível a adesão à atividade física.
Desde 2013, o foco da atenção primária à saúde em Manaus tem se ampliado.
Além de atender aos acometimentos espontâneos de saúde, intensificou-se a promoção à saúde pela cidade.
Uma das políticas mais visíveis são as academias ao ar livre. Elas são cerca de 60 na cidade, pensadas para incluir a população idosa, pois priorizou-se equipamentos possíveis, sobretudo, para eles. Mas são destinadas a toda a população.
Além delas, há as aulas de dança oferecidas gratuitamente nos centros sociais dos bairros.
Prevalência de obesidade na população adulta com mais de 18 anos
Capital
Percentual por sexo
Média total
1º
Manaus
Homens: 21% Mulheres: 25,7%
46,7
1º
Rio Branco
Homens: 23,3% Mulheres: 23,4%
46,7
2º
Macapá
Homens: 20,4% Mulheres 25,2%
45,6
3º
Natal
Homens: 24,3% Mulheres: 21%
45,3
4º
Campo Grande
Homens: 23% Mulheres: 22%
45
5º
Cuiabá
Homens: 21,9% Mulheres: 23%
44,9
6º
Porto Alegre
Homens 23,2% Mulheres: 20,3%
43,5
7º
Rio de Janeiro
Homens 20,1% Mulheres 23,1%
43,2
8º
Recife
Homens: 19,7% Mulheres: 23,4%
43,1
9º
Boa Vista
Homens: 24,6% Mulheres: 17,9%
42,5
10º
João Pessoa
Homens: 18,6% Mulheres: 21,8%
40,4
11º
Belo Horizonte
Homens 20,7% Mulheres 19,2%
39,9
12º
Fortaleza
Homens: 18,9% Mulheres: 20,9%
39,8
13º
São Paulo
Homens 18,5% Mulheres 21,1%
39,6
13º
Porto Velho
Homens: 21,6% Mulheres: 18%
39,6
14º
Maceió
Homens: 17,5% Mulheres: 22%
39,5
15º
Goiânia
Homens: 20,6% Mulheres: 18,6%
39,2
16º
Curitiba
Homens 21,1% Mulheres: 17,9%
39
17º
Aracaju
Homens: 18,7% Mulheres: 19%
37,7
18º
Belém
Homens: 20,1% Mulheres: 16,1%
36,2
19º
Salvador
Homens: 15,5% Mulheres: 20,3%
35,8
20º
Florianópolis
Homens: 18,8% Mulheres: 16,6%
35,4
21º
Teresina
Homens: 17,1% Mulheres 18%
35,1
21º
Vitória
Homens 16% Mulheres 19,1%
35,1
22º
São Luís
Homens 18,8% Mulheres: 15,8%
34,6
23º
Palmas
Homens 16,6% Mulheres: 14,3%
30,9
Fonte: Abeso
Fotos: divulgação