O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal o julgamento antecipado de
ação civil pública que pede a condenação da União, representada pelo governo de Jair Bolsonaro, e da Funai por discurso de ódio contra povos indígenas e direito de reposta ao povo indígena waimiri-atroari.
A ação civil pública foi apresentada em março deste ano, para que a Justiça Federal no Amazonas declare a omissão do Estado brasileiro. Esta, portanto, na condução da política indigenista e a violação de direitos fundamentais dos povos indígenas, notadamente do povo waimiri-atroari, em razão do fomento ao discurso de ódio e da defesa de um projeto integracionista em relação a este e aos demais povos indígenas brasileiros.
Pedidos
Os pedidos da ação são: direito de resposta em sítios oficiais e no Twitter, orientação aos agentes públicos federais sobre o tema, elaboração de plano de combate ao discurso de ódio, pedido de desculpas público à etnia e elaboração de cartilha sobre a sua história.
Em abril, a 3ª Vara Federal no Amazonas atendeu a pedidos do MPF e determinou, em caráter liminar, que o governo brasileiro publicasse uma carta dos indígenas waimiris-atroaris no site do Planalto.
A decisão liminar determinou também que a União e Fundação Nacional do Índio (Funai) indicassem às autoridades públicas que não incitassem ou encorajassem discriminação racial, por meio de circular e manifestação pública dos ministérios e da Presidência da República, e que elaborassem um plano de combate ao discurso de ódio contra povos indígenas no âmbito do Estado e na sociedade brasileira.
O MPF chegou a apresentar à Justiça Federal a carta dos waimiri-atroari para ser publicada no site do Planalto. No entanto, a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) suspendeu os efeitos da liminar. A princípio, a decisão foi concedida pela Justiça Federal no Amazonas.
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Discurso discriminatório continua
Após contestação feita pela União e pela Funai, o MPF apresentou à Justiça Federal réplica. Logo, prosseguiu reafirmando a legalidade da ação. Bem como a necessidade de intervenção judicial para evitar que o governo brasileiro siga incitando ódio contra os povos indígenas.
O MPF destaca que, mesmo após o ajuizamento da ação, as manifestações de caráter discriminatório contra povos indígenas não cessaram.
Exemplo disso foi a fala do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante live, em 16 de julho. Na transmissão ele culpou “o indígena, o caboclo” por “parte considerável” do desmatamento.
Em abril, o então ministro da Educação Abraham Weintraub se manifestou em relação aos povos indígenas. Durante reunião ministerial, ele expressou: “Odeio o termo povos indígenas, odeio esse termo. Odeio. Só tem um povo nesse país. Quer quer. Não quer sai de ré…”.
Para o MPF, a medida que se busca na Justiça com a ação civil pública visa justamente coibir a repetição destas práticas.
O órgão destaca a continuidade escancarada do fomento ao ódio contra os povos indígenas. Além disso, a entidade afirma que nenhuma norma do direito brasileiro legitima estas condutas. Nesse sentido, é apresentado que todo o sistema jurídico é coordenado para coibir as práticas as citadas. Além disso deve promover o bem de todos. Estes, portanto, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou outras formas de discriminação.
Danos concretos aos waimiris-atroaris
Na manifestação apresentada à Justiça, o MPF explica que, no caso do povo waimiri-atroari, o discurso discriminatório tem como pano de fundo principal a implantação de uma linha de transmissão.
Dessa forma, esta pretende cruzar o território indígena, além da disputa pela circulação na rodovia BR-174. A partir disso cria um cenário favorável a práticas de violência contra esse povo.
Uma das práticas decorrentes deste cenário ocorreu em 28 de fevereiro de 2020. Na ocasião um deputado se dirigiu à entrada do território e, com o uso de uma motosserra, cortou o tronco que sustentava as correntes que bloqueiam o acesso à BR-174. Durante a ação, o deputado gravou um vídeo e dedicou a ação ao presidente da República.
“Todo o cenário já descrito criou uma realidade de tensão e hierarquização entre interesses e bens jurídicos que acabou por gerar a premissa do deputado estadual de que estava autorizado a fazer justiça com as próprias mãos. O episódio mostra como o discurso parcial e contrário aos povos indígenas, associado à falta de preocupação com os ritos e procedimentos legais, favorecem um discurso de ódio e práticas violentas contra os grupos étnicos ou contra os seus territórios. No caso em exame, os relatos mencionam a manutenção em cárcere privado de alguns indígenas Waimiri Atroari durante a quebra das correntes e a filmagem pelo deputado, que tentou fazer justiça com as próprias mãos e apresentar o resultado ao Presidente da República.”, afirma trecho da manifestação do MPF.
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Desculpas
O órgão reforça a importância do pedido de desculpas público. Sobretudo por parte do governo brasileiro, em relação ao povo indígena waimiri-atroari.
Além disso o MPF indica a necessidade de elaboração de cartilha. Sobretudo deve ser de autoria dos indígenas e custeada pelo governo federal. No conteúdo deve haver a história desse povo, que deverá ser divulgada em todos meios governamentais. Assim como nas redes sociais da Presidência, disponibilizada permanentemente nos sites do governo federal.
A ação tramita sob o número 1004416-31.2020.4.01.3200 na 3ª Vara Federal no Amazonas, onde aguarda sentença.
Fonte: MPF
Foto: Reprodução/Presidência da República