Senado aprova ‘banda de preços’ do combustível; estados rejeitam
Caminhoneiros também não gostaram das propostas, que criam estabilização de preços, fundo de apoio e auxílio-gasolina, além de regra do ICMS

Aguinaldo Rodrigues
Publicado em: 10/03/2022 às 22:11 | Atualizado em: 11/03/2022 às 00:07
No dia em que a Petrobrás anunciou novo reajuste no preço da gasolina e derivados em quase 25%, o plenário do Senado, com os votos “sim” e “não” dos senadores do Amazonas, aprovou, nesta quinta-feira (10), dois projetos de leis para estancar a escalada de preços dos combustíveis.
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 11/2020 altera a regra de incidência do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS) sobre os combustíveis.
Já o PL 1472/2021 cria regras para estabilização dos preços de combustíveis. Neste projeto o senador Plínio Valério (PSDB) deu o único voto “não” da bancada amazonense.
“O mototaxista, o taxista, o motorista de aplicativo, nossos irmãos do interior do Amazonas, que conduzem seu barco com motor rabeta, não têm mais condições de pagar esse preço absurdo pela gasolina. Por isso, apresentei a proposta de criação do vale-gasolina a quem mais precisa, que foi aprovada pelo Senado”, disse o senador Eduardo Braga (PMDB-AM).
O Senado também aprovou a criação da Conta de Estabilização dos Preços dos Combustíveis, um fundo com o objetivo de conter a alta dos preços e ainda a ampliação do vale-gás, dobrando o alcance do benefício.
Foram 68 votos a favor, 1 contrário e 1 abstenção. Agora a proposta, que foi aprovada na forma do substitutivo apresentado pelo relator da matéria, senador Jean Paul Prates (PT-RN), retorna para nova votação na Câmara dos Deputados.
Solução possível
Durante a votação do texto do outro projeto de lei complementar (1.472/2021), os senadores afirmaram que o sistema proposto é a solução “possível” neste momento para a crise do petróleo, mas defenderam que o Brasil busque a autossuficiência na produção de combustíveis para não depender de importações.
Na avaliação do relator, Jean Paul Prates, a medida é estruturante e vai permitir que os estados implantem a monofasia sem perdas financeiras. Para ele, a mudança poderá facilitar a fiscalização tributária e reduzir a sonegação, com potencial de aumentar a arrecadação.
Prates disse acreditar que, com o projeto, os combustíveis serão menos afetados por flutuações conjunturais.
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De acordo com o substitutivo, poderão ser submetidos a essa tributação o diesel, o biodiesel, a gasolina, o etanol anidro (que é misturado à gasolina), o gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás liquefeito de gás natural e o querosene de aviação.
Atualmente, o ICMS sobre combustíveis varia de estado para estado e é calculado em toda a cadeia de distribuição e sobre um preço médio na bomba.
A ideia é que o tributo passe a ter um preço fixo, em reais, por litro de combustível, em vez de ser cobrado como uma porcentagem sobre o preço final do produto.
Conforme o projeto, a cobrança do imposto será na origem, ou seja, na refinaria ou na importação do combustível, e não mais em toda a cadeia de distribuição.
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Reação dos governadores
O coordenador do Fórum de Governadores, Wellington Dias, do Piauí, reagiu à aprovação do projeto do Senado que cria as “bandas do ICMS” dos combustíveis.
“Já está provado que o aumento dos combustíveis não parou de novembro para cá, mesmo com o ICMS congelado, por decisão dos governadores e Confaz. Então, nada vai mudar. Hoje mesmo mais um mega-aumento da gasolina e óleo diesel e com ICMS igual ao novembro. Por que o aumento? Não foi o ICMS. E sim a indexação ao preço internacional”, escreveu Dias nas redes sociais.
Projeto inconstitucional
Na opinião do governador do Piauí, o projeto de lei 1.472/2021 do jeito que foi votado é inconstitucional e os chefes do poder Executivo estaduais vão ao STF evitar prejuízo para o nosso povo.
Para Dias, o projeto de lei aprovado coloca a média móvel dos últimos 5 anos, um valor fictício, segundo ele, muito abaixo para realidade dos preços atuais.
“Não vamos aceitar tirar dinheiro do povo, pois dinheiro público é do nosso povo, para mandar para a jogatina da especiação e lucros como dos R$ 103 bilhões da Petrobrás distribuído para aplicadores, do povo pobre para bolso dos mais ricos”.

Valor fixo do ICMS
Por sua vez, a Câmara vai analisar o projeto 11, que estabelece o valor fixo do ICMS. A votação da proposta depende de aprovação pelo Senado.
Aprovado em outubro de 2021, o projeto de lei complementar 11/20 obriga estados e Distrito Federal a especificar a alíquota para cada produto por unidade de medida adotada, que pode ser litro, quilo ou volume, e não mais sobre o valor da mercadoria.
Na prática, a proposta torna o ICMS invariável em relação a mudanças no preço do combustível ou no câmbio.
Atualmente, o ICMS incidente sobre os combustíveis é devido por substituição tributária para frente, sendo a sua base de cálculo estimada a partir dos preços médios ponderados ao consumidor final, apurados quinzenalmente pelos governos estaduais. As alíquotas de ICMS para gasolina, como exemplo, variam entre 25% e 34%, de acordo com o estado.
Agenda “torta” de Paulo Guedes
Houve reação também dos caminhoneiros. O presidente da Abrava (Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores), Wallace Landim, o Chorão, disse que o Senado e a Câmara dos Deputados são reféns do Palácio do Planalto e acabam acatando a “agenda torta” do Ministério da Economia.
“Essa aprovação não refresca em nada, pois, tem mais 20% de aumento do diesel ainda para vir. Vai tirar o PIS e Cofins, mas o preço final ainda vai continuar alto, ainda tem que passar pela Câmara e se tiver alteração no texto volta para o Senado”, disse Chorão.
Cotações internacionais
O representante dos motoristas autônomos do Brasil chama a atenção e mostra preocupação com o Art. 68-F, do projeto 11/2020. O dispositivo diz que: os preços internos praticados por produtores e importadores de combustíveis derivados de petróleo e GLP, inclusive o derivado de gás natural, devem ter como referência as cotações médias do mercado internacional, os custos internos de produção e os custos de importação, conforme aplicáveis.
“A nossa preocupação é com esse artigo, pois, ele transforma o projeto 11, que era um decreto em lei e deixa o cabresto solto para quem estiver no comando da Petrobrás fazer o que quiser com o preço dos combustíveis”, disse Chorão.
Com relação ao auxílio-gasolina de R$ 300, de Braga, Landim chamou de “conversa fiada”, pois, caminhoneiro não precisa de auxilio, precisa de respeito.
“Vamos continuar na luta, mas a sociedade precisa acordar, a conta do diesel não é do caminhoneiro, quem paga é todo povo brasileiro”, disse o presidente da Abrava.
Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado