O Senado aprovou o projeto de lei complementar (PLP 275/20129), que torna relevante interesse público da União a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica por terras indígenas.
A proposta do senador Chico Rodrigues (União-RR) também assegura compensação financeira às comunidades indígenas afetadas.
A votação ocorreu no último dia 4 de maio e teve aprovação de 60 senadores, incluindo os representantes do Amazonas e Roraima, estados por onde passa a linha de transmissão de energia que liga Boa Vista a Manaus.
Da bancada do Amazonas, os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Plínio Valério (PSDB-AM) votaram “sim”, da mesma forma como Chico Rodrigues e Mecias de Jesus (Republicanos), de Roraima. Os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Telmário Mota (Pros-RR) não registraram voto.
Apenas os senadores Eliziane Gama (Cidadania-MA), Flávio Arns (Podemos-PR), Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Zenaide Maia (Pros-RN) votaram contra a proposta. Mara Gabrilli (PSDB-SP) se absteve. O PLP 275 seguiu para a Câmara dos Deputados.
Agora, com a aprovação do projeto de lei, os Waimiri Atroari temem recuo nas negociações em torno das compensações socioambientais por conta da passagem da linha de energia pelas terras indígenas.
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Por meio de um de seus advogados, a comunidade informou que não aceitará alterações nos compromissos firmados com a Transnorte Energia S.A.
A empresa é a responsável pela construção da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista, que vai atravessar a terra indígena Waimiri Atroari, localizada entre Roraima e Amazonas.
“Qualquer coisa fora do que foi acordado, nós cancelamos o acordo e acabou. E qualquer deslize da empresa, os indígenas vão proibir a entrada na terra indígena”, afirmou Jonas Fontenele de Carvalho, advogado da Associação Comunidade Waimiri Atroari (ACWA).
A declaração de Carvalho foi dada ao Instituto Socioambiental (ISA) no dia em que o plenário do Senado aprovou projeto de lei complementar (PLP) 275/2019.
Na avaliação do advogado do povo Waimiri Atroari, o projeto autoriza prévia e indiscriminadamente a implantação de sistemas de transmissão nas terras indígenas em todo país, desconsiderando impactos específicos em cada território.
Decreto de Bolsonaro
Horas antes da votação do dia 4 de maio no Senado, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto, autorizando o governo federal a pagar parte das compensações socioambientais pelo linhão entre Roraima e o Amazonas.
O receio de organizações da sociedade civil e de alguns parlamentares da oposição é de que a aprovação do PLP possa prejudicar as negociações feitas com os Waimiri e a execução da norma editada pelo Palácio do Planalto.
O decreto não menciona nem o linhão que passa na terra indígena nem qualquer valor a ele referente, mas, após se reunirem com Bolsonaro, políticos de Roraima afirmaram que até R$ 90 milhões poderiam ser disponibilizados. Outros R$ 33 milhões seriam cobertos pela Transnorte Energia.
Valor das compensações
Jonas de Carvalho afirmou que o total das compensações ainda está sendo calculado. O advogado negou que as tratativas e os procedimentos para o início da construção tenham sido concluídos.
Ele contou que os termos do acordo deverão ser chancelados pelo Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal, onde tramitam ações que paralisaram a obra.
O advogado explicou que todas as negociações são feitas entre a Transnorte e a comunidade e que o acordo se dará com o pagamento das compensações socioambientais da obra aos indígenas.
“A nossa conversa é com a empresa que vai passar a linha. E essa conversa está muito bem costurada”, salientou.
De acordo com Carvalho, os recursos autorizados pelo decreto e que serão aportados pelo governo não são destinados aos Waimiri, mas servirão para ressarcir parcialmente a firma pelos custos de compensação.
A Transnorte Energia foi procurada pela reportagem, mas a assessoria informou que a corporação não se manifestaria.
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Empreendimento paralisado
Dos 715 km do linhão, 122 km estão previstos para atravessar a Terra Indígena Waimiri Atroari.
Há mais de dez anos, as comunidades indígenas lutam para ser consultadas sobre o projeto.
A Justiça Federal paralisou a obra até que os indígenas sejam ouvidos e que as medidas de compensação propostas por eles sejam cumpridas.
Com o custo estimado de R$ 2,3 bilhões, o empreendimento foi leiloado em 2011, mas sofreu repetidos atrasos por causa da negativa do governo em realizar a consulta prévia às populações indígenas.
Além disso, a administração federal não fez as alterações exigidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) nos estudos de impacto ambiental.
No ano passado, sob orientação da gestão Bolsonaro, Ibama e Fundação Nacional do Índio (Funai) foi liberado o licenciamento ambiental sem que as exigências fossem atendidas.
A empresa responsável, a Transnorte Energia, e o governo também não se entendem sobre o preço da obra. Apesar disso, durante anos, políticos de Roraima alegaram que os responsáveis pela obra não sair eram os Waimiri.
Com informações do Instituto Socioambiental (ISA )
Foto: PAC